CARLOS ROSA MOREIRA
CARLOS ROSA MOREIRA
Membro do Cenáculo Fluminense de História e Letras, da Academia Niteroiense de Letras e da Associação Niteroiense de Escritores. Tem oito livros publicados, todos de crônicas e contos.

Por: CARLOS ROSA MOREIRA

22/09/2024

07:12:16

O CASAL

O casal entrou no terraço do restaurante e sentou-se na mesa ao lado...
O CASAL
...Eu bebia uma cerveja e pensava vagamente em alguém, mas o casal chamou minha atenção. Ela devia andar pelos setenta. Usava um short e uma camisa larga. O short deixava à mostra as pernas pesadas e a camisa não escondia as dobras de gordura do abdômen. Os cabelos grisalhos, curtos e repartidos do lado, num estilo masculino, como é comum as mulheres maduras usarem em nome da praticidade, deixavam-na com o semblante um pouco duro. O garçom se chegou à mesa deles.

— O que vai querer? - ela perguntou ao rapaz.

Ele olhava o cardápio.

- Tem aqui uma picanha compreta...

- Pode pedir.

O rapaz pediu o prato e a cerveja.

— Essa semana eu termino o embouço da parede - disse ele.

Ela concordou levemente com a cabeça e seu olhar percorreu as outras mesas, enquanto ele fazia observações sobre a massa a ser usada para o emboço. O garçom trouxe a cerveja. O rapaz se serviu e a serviu; antes que ela experimentasse, ele deu duas boas goladas. Então meus olhos se desviaram dela e passei a observá-lo. Era um rapaz escuro meio claro, com cerca de quarenta anos.

Acho que o Brasil é o único lugar no mundo onde o escuro pode ser claro. Vestia uma calça de padrão ousado de uma das grifes mais caras da zona sul; a camisa era francesa e calçava docksides.

O garçom chegou com a comida e serviu os dois. Ele baixou a cabeça no prato, garfo na mão direita e faca na esquerda. Os talheres passaram a funcionar em grande atividade, um junto ao outro, a faca juntando a comida no garfo, que era levado à boca continuamente, como os ferrões de uma incansável formiga que precisa destroçar sua presa com rapidez. Ela dava garfadas lentas e longas.

- Está bom? - ela perguntou.

Ele levantou um pouco a cabeça e respondeu sem parar de mastigar: "Muito bom"

Ele não precisava daquela pressa, mas é provável que durante toda a sua vida tenha tido somente um tempo para se abastecer de comida. E comer, estivesse onde estivesse, era isso: abastecer-se.

Ela terminou de almoçar o pouco que havia colocado no prato. Ele ainda continuou naquele frenesi de mexer garfo e faca como ferrões. Depois ela acendeu um cigarro, tragou e, vagamente, soltou a fumaça no ar. Ele palitava os dentes. Foi ele que perguntou:

- Vai querer que eu leve o carro amanhã pra revisão?

Aquilo é mole de fazer. Concessionária cobra uma grana.

Ela comentou alguma coisa sobre a garantia com a primeira revisão. Permaneceu em silêncio por alguns segundos, soltou duas baforadas e falou sem olhar para ele:

- Meu marido gostava de vir aqui aos sábados, antes do almoço. Trazia nosso cachorrinho, o cachimbo e o jornal. Tomava uma cerveja, sempre ali, naquela mesa.

Ele se virou para ver a mesa.

- Nós morávamos nesta rua, na esquina com a praia.

- Morava mal não, hein!

- É... faz muito tempo... Quer mais alguma coisa?

Vou pedir a conta.

- Pode pedir.

O garçom trouxe a conta.

— Você leva o carro? - ela perguntou já entregando a chave a ele. E saíram do restaurante de mãos dadas.


FRIWEB
ÊXITO RIO - 22 ANOS
Relacionadas

COLUNA SOCIAL

 CHICO VELLOZO QUER SABER! – INAUGURADA A ROTA TIRADENTES
CHICO VELLOZO QUER SABER! – INAUGURADA A ROTA TIRADENTES
Conversamos com Augusto Theodoro – o “Professor Augusto” – representante da Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Nova Friburgo, que prestigiou a...

COLUNA SOCIAL

 CHICO VELLOZO QUER SABER! – INAUGURADA A ROTA TIRADENTES
CHICO VELLOZO QUER SABER! – INAUGURADA A ROTA TIRADENTES
Conversamos com Adriano Machado, atuante membro Núcleo de Proteção Ambiental e Defesa Civil de Amparo NUPDEC, que prestou apoio na inauguração do percurso....