
Por: CARLOS ROSA MOREIRA
29/07/2023
09:05:05
COMUNHÃO

Saí nadando ao lado do “Torreão” e fui até as “Duas Irmãs”, dali escalei e subi ao fortim, depois peguei a velha trilha que circunda a Boa Viagem. Minha intenção era continuar o exercício, dar mais umas braçadas e correr na praia, mas ouvi uns gorjeios e parei no meio da mata. Era uma cambaxirra. Fazia tempo que não ouvia uma cambaxirra; ou, talvez, há tempo não percebia que já não ouvia cambaxirras. Abaixei-me, buscando o pequenino no meio das galhadas. Cambaxirras são mais fáceis de ouvir do que de ver, mas vi o bichinho a saltitar por entre os ramos de uma aroeira: saltita e gorjeia, gorjeia e saltita.
Estava eu a ver e a ouvir cambaxirra,
quando o tempo mudou. O céu cinzento já ameaçava, aí o vento rondou e deu uma
varrida no mar. Caíram pingos grossos e espaçados, e logo a chuvada veio. Toró
que lavou o sal do meu corpo e retirou da mata a poeira urbana. Quando cessou,
deixou as folhas com um verde brilhante e o ar todo perfumado com aquele cheiro
bom de terra. Depois da chuva e da ventania restou uma brisa suave vinda do
sul. Um sabiá-laranjeira pousou num galho acima da minha cabeça, cantou como se
fosse o último dia de sua vida e depois embarafustou-se por entre as ramas da
aroeira onde gorjeava a cambaxirra. Atobás pairavam bem alto, um bem-te-vi
clamava da terra e eu respirei fundo aquele ar a minha volta. Quieto, não
queria que a natureza soubesse de mim. Bem ao lado contorcia-se uma
pitangueira. Raquítica, parecia sofrida, batida incessantemente pelos ventos
marinhos. Remanescente dos tempos em que por aqui reinavam tupinambás e
maracajás. Esguia e silenciosa uma ingazeira observava. Muitas vezes provei a
polpa adocicada dos seus frutos. Fico fascinado ao encontrar essas dádivas no
meio da mata. Nossas árvores, nossos frutos que também fascinaram o peró e o mair que vieram de longe para brigar por essas praias.
Estava eu naquele êxtase, a ver
belezas e a ouvir melodias, percebendo sabores e sentindo perfumes. Então fui
tomado por uma grande vontade de ficar ali. E pensei que talvez não fosse mau
morrer assim, espojado sobre a terra. Morrer como um bicho qualquer que se vai
deste mundo, tendo a companhia de uma bromélia, os olhares coloridos das
orquídeas, acalentado pelos trinados dos pássaros e envolto pela brisa do mar.
Só deitar e morrer, deixar o corpo na terra para rebrotar e, algum dia, de
algum modo, ser de novo coisa viva. Talvez uma árvore que ofereça um perfume
selvagem ou um singelo fruto sápido. Um modesto vegetal que, se nada tiver a
oferecer, cubra o caminho com a simplicidade de uma sombra fresca em meio ao
silêncio da mata. Esse silêncio sussurrado das plantas que às vezes embala
estranhos sonhos.
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